domingo, 7 de fevereiro de 2010

Compaixão não é pieguice, sabedoria não é erudição. (Shin Budismo)

30.11.09

Lendo o último post – é assim que se fala? – uma pessoa me disse que está passando por um sofrimento muito mais sério do que a falta de leite na geladeira ou gato enroscando na perna. E que, além disso, não tem paciência para ficar ouvindo lorotas dos outros e tudo que passa na sua mente é para beneficio próprio: quer tudo que lhe seja agradável, tem aversão a tudo que é desagradável e, muitas vezes, só faz o que é dito como certo porque não tem a coragem de afrontar as convenções sociais.
É natural, isso acontece porque a nossa natureza búdica convive com a natureza humana. Deve ter acontecido com o próprio Sidarta, mesmo depois de deixar o palácio do comodismo e da alienação para adentrar o caminho da ascese. Shinran Shonin, o fundador do Shin Budismo da Terra Pura, vê nas oscilações da sua disposição espiritual a fragilidade e o relativismo do próprio poder (jiriki) e ressaltar a consistência de diamante e a firmeza da verdade contida no Outro Poder (Tariki).
Esse posicionamento do Shin Budismo representa a própria essência do budismo mahayana e pode ser compreendido perfeitamente por aqueles que aceitam a vida como dukkha, a Primeira Nobre Verdade enunciada por Buda Sakyamuni após o despertar da iluminação.
Dukkha costuma ser traduzido como a nobre verdade da dor, do sofrimento, da miserabilidade humana. Ele é o próprio impacto continuado da impermanência, interdependência e insubstancialidade sobre o nosso ego, que é constituído de agregados (skandhas) de sensações, sentimentos, pensamentos e emoções que, por sua vez, são impermanentes, interdependentes e insubstanciais. Dukka não é pessimista nem otimista. é uma visão objetiva da vida e do mundo.
Assim, seria um grande equívoco pensar que o budismo adota uma postura passiva e conformista perante a vida, como se fosse uma espécie de filosofia meramente existencialista. Na Segunda Nobre Verdade, samudaya, Buda Sakyamuni chama atenção à nossa responsabilidade individual ao esclarecer que tudo que ocorre na nossa vida têm causas originárias, que dependem de condições especificas para o seu desenvolvimento ou extinção. é a visão analítica e dinâmica da vida, revertendo a postura fatalista, determinista e conservadora do carma hinduísta. No carma budista, podemos despertar para as causas do nosso sofrimento - quer sejam as próximas ainda presentes no nosso consciente ou as remotas perdidas no inconsciente - e - com a nossa ação no presente - criar novas condições para a sua extinção e para o desenvolvimento de boas causas.
Fica claro que Buda Sakyamuni não nega a felicidade quando diz que há sofrimento na vida. Ao contrário, a criação de condições para a extinção do sofrimento – nirodha - é a própria felicidade, proclamada por ele como a Terceira Nobre Verdade. é certo que podemos extinguir o sofrimento e indagações de como ou quando atingimos o nirvana – o estado ou postura de não sofrimento - não comportam respostas gerais e abstratas, pois dependem da experiência do carma individual e da responsabilidade pela ação no presente de cada um. O budismo do sudeste asiático diz que, em busca de palavras que definam o nirvana e na ansiedade dessa busca, patinamos como elefantes na lama. Ficamos enlameados de palavras no burilar de conceitos ilusórios para tentar arrancar as raízes do apego, interromper o ciclo continuado de dúvidas e medos, escapar da ansiedade crescente. Essa busca pode ser a própria causa do sofrimento.
Assim podemos entender a Quarta Nobre Verdade – magga – como o caminho da coragem da compaixão e lucidez da sabedoria, como foi a própria vida do Buda Sakyamuni. é o Caminho do Meio, mas ele nunca ficou em cima do muro ou pregou um moralismo mundano de convenções sociais. Ao contrário, reafirmou o nosso processo individual de criação, transformação e atualização para acompanhar a impermanência, a interdependência e insubstancialidade da vida.
Gostaria que vocês acessassem a apresentação sobre As Quatro Nobres Verdades e refletissem por que dei esse título: compaixão não é pieguice, sabedoria não é erudição.

Retirado do Site:
http://www.terrapuradf.org.br/blogdomonge_arquivo.php?post=241

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